quinta-feira, 24 de junho de 2010

Quem tem o que dizer pode falar de qualquer coisa

"Quem pinta a fachada de azul pavão com listras vermelhas não está escondendo a chatice do viver.[...] São bonitezas da alma. São sonhos fritos com canela e açúcar."

Nina Horta, Folha de São Paulo, 24/06/2010

Nina Horta tem, às quintas, uma coluna de gastronomia na Folha de São Paulo. Entretanto escreve sobre o que lhe dá na telha, o que é uma delícia. É sábia, leve e irreverente, como uma velha cozinheira que aprendeu de tudo e escolhe servir o mais trivial dos pratos.

quarta-feira, 23 de junho de 2010

ponto de inflexão


"beast", de William Wray

Gente, descobri um cara que pinta como eu gostaria de pintar (williamwray.blogspot.com/). Fiquei tão alvoroçada que mal consigo trabalhar nas coisinhas que venho fazendo. É claro que sempre soube que eu sou "café com leite", mas isto mexeu comigo.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

como quase matei um amigo engasgado de tanto rir

Não há nada mais engraçado do que uma piada involuntária. Há muitos e muitos anos, estava eu na fila de espera dos elevadores do edifício Jaime Canet, em Curitiba, onde então trabalhava, quando notei à minha frente uma colega de outro departamento, alguns andares acima do meu, com quem na verdade eu jamais tinha antes conversado. Mas eu sabia que ela voltava de uma licença maternidade e, depois do breve cumprimento de sempre, achei por bem fazer as perguntas de praxe: foi tudo bem?, como é que está o neném?, etc. e tal... Ela prontamente sacou da bolsa e me passou um álbum de fotos para que eu soubesse de tudo com meus próprios olhos. Alguns segundos depois o elevador chegou, entramos todos, e eu inadvertidamente comecei a folhear o álbum, sentindo vários pares de olhos por sobre o meu ombro, não sei se constrangidos como eu, ao ver a sucessão de fotos da moça nua, completamente pelada, com o filhinho mamando, o filhinho arrotando, o filhinho dormindo, etc. Eu achei a coisa de extremo mau gosto e fiquei aliviada quando o elevador parou no meu andar e me livrei daquilo. Fui correndo contar o episódio estúrdio ao meu bom, engraçado e espirituosíssimo amigo Sérgio Ijaile que – vim a descobrir depois – não ia nem um pouco com a cara dessa moça. Ao final do meu relato, que ouviu o tempo todo com um ligeiro ar de quem cheira peido, ele perguntou:
- e a bazófia dela, também aparecia na foto?
Eu, que até então nunca tinha ouvido essa palavra, bazófia, não tive entretanto qualquer dúvida quanto ao seu significado, e prontamente respondi:
- Não, também não chegou a tanto, o neném estava acomodado justamente em cima da “bazófia”.

terça-feira, 8 de junho de 2010

momento copel


O incrível exército de Brancaleone, incompleto.
Em pé, da esquerda para a direita: Luiz Kamogawa, Marco Aurélio (Silva?), Walfrido Vitorino Ávila, Rui Dykran Stephen, Anderson (?), Liberato Álvaro Massucci;
Sentados, da esquerda para a direita: Geraldo (Mendes?) Antônio Fonseca dos Santos, eu, Denise Campanholo Busetti.
Faltam Paulo Henrique Siqueira Born, Sérgio Montenegro Kraemer e Martha Regina von Borstel Sugai

outros tempos


Faz já uns trezentos anos eu trabalhei na fiscalização dos serviços de hidrometria que a SUREHMA fazia (não sei se ainda faz) para a COPEL. Era um trabalho para lá de chato, que consistia basicamente em receber os dados de campo, prepará-los para digitação, corrigir os que voltavam da digitação, alimentar com eles os programas que geravam os dados secundários, desenhar uma infinidade de curvas, verificar as inconsistências, encher o saco do pessoal da SUREHMA por causa das inconsistências, enfim ... Periodicamente ia-se a campo, eu e meus colegas, para fiscalizar a condição dos postos de observação ao longo dos rios: de ordinário era só verificar a condição dos pluviômetros, o nivelamento das réguas e a presteza dos observadores recrutados entre os ribeirinhos. Mas, às vezes, era preciso entrar no rio para fazer uma medição direta, e isto só era possível junto com uma das equipes de hidrometristas, não só porque eles é que tinham o barco e o equipamento de medição, mas principalmente porque eles é que sabiam enfrentar o rio. O trabalho de um hidrometrista é mal pago, pesado e penoso, exige que se viva a maior parte do tempo em trânsito, praticamente o mês todo longe de casa, acampado na barranca dos rios, com frio, com calor, abaixo de chuva, e com frequência em condições muito perigosas, na época das cheias. Não é de se admirar que grande parte dos hidrometristas com quem convivi naquele tempo tivesse problemas de alcoolismo. A SUREHMA contornava essa questão “temperando” as duplas de técnicos que saiam a campo, de modo que um deles fosse sempre muito sóbrio e careta, mesmo que apenas medianamente competente, e de preferência com ascendência moral sobre o companheiro, o “problemático”, mas de cuja competência não se podia prescindir. Dos “problemáticos” eu me lembro especialmente de um, uma figura engraçada e já folclórica entre nós da hidrologia, de quem se dizia ser a pessoa mais confiável para se ter ao lado no barco, se o rio não estivesse para peixe. Esse camarada, acaso o encontrasse nas reuniões esporádicas em nossas sedes em Curitiba, bem composto e escanhoado, parecendo sempre um pouco desconfortável, tratava-me com uma cerimônia fora de propósito, só se dirigindo a mim em último caso, sem nunca me olhar nos olhos e me tratando por “senhora”. Já se o encontrasse no campo, ele, ainda cerimonioso, mas agora de modo franco e natural, sempre ligeiramente “alegre”, tratava-me por “neguinha”.
Na foto, à direita, numa balsa de travessia do rio Ivaí, em Tereza Cristina, meu colega Ruy Dikran Stephen; à esquerda um hidrometrista da SUREHMA (não o desta crônica), de quem só me ficou o apelido (Beto) e a lembrança de que passava dias a fio se alimentando de bolacha de mel, por nojo de comer nas espeluncas em que a gente comia ao longo do trajeto.

poeta sentado na escada